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O que eu aprendi com a surdez

Eu sou surda!


Se você colocou um risinho no rosto, não se preocupe, a maioria das pessoas acha que eu estou brincando, quando eu falo que sou surda. Na verdade, sou parcialmente surda, por enquanto.


Em 1997, aos meus 31 anos, comecei a perceber que quando eu atendia o telefone com o ouvido direito, ouvia bem mais baixo do que com o ouvido esquerdo. Fiquei tão intrigada com isso, que comecei a pedir a outras pessoas que testasse meu aparelho para descobrir se era só comigo. A maioria das respostas era negativa. Pensei, pode ser cera no ouvido.


Resolvi consultar um médico para tirar a tal cera. Realmente tinha cera, mas o médico disse também que existia uma grande chance de ser Ortoesclerose Precoce, quando o ouvido envelhece mais rápido do que o restante do corpo. É uma doença degenerativa, genética e hereditária. Foi um susto danado e entrei, durante um tempo, em um estado de sofrimento e negação.


Quando já não estava mais ouvindo direito as pessoas, voltei ao médico, que me recomendou usar um aparelho auditivo.


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Em 2002, eu viajava para o Pará a trabalho com bastante frequência. Chegava a passar 15 dias seguidos, em cada viagem. A empresa ficava no meio da floresta amazônica. Uma experiência única, todos deveriam visitar e sentir a beleza e força da floresta. E lá ouvíamos muitas histórias sobre a sua flora, fauna e seus costumes. Uma curiosidade interessante foi saber que os animais não gostavam de se aproximar das vilas residenciais e nem da mineração, porque eles não suportavam o barulho que nós, humanos, produzíamos. E como a comida na floresta é abundante, era raro ver animais de grande e médio porte nas proximidades.


No meu primeiro dia de uso do aparelho auditivo fiquei super feliz em voltar a ouvir e descobrir sons que há muito tempo não notava. Era uma surpresa atrás da outra. Porém ao final do dia, quando cheguei em casa, a minha primeira ação foi retirar o aparelho do ouvido. Algo nele me incomodava muito. Terminei o dia bem mais exausta do que o normal e não sabia o porquê.


Cheguei ao final do segundo dia da mesma forma e com um estresse acima do normal. Foi um mês terrível de adaptação ao novo volume auditivo. Foi, então, que eu lembrei que os animais da floresta não gostavam do barulho das vilas e comecei a entendê-los melhor. Somos barulhentos demais. E percebi, também, o quanto o silêncio é confortável, gostoso e relaxante.


Os médicos dizem que a perda é inevitável e que pode ser que um dia eu não ouça mais. Eu digo que a perda pode ser inevitável, mas o Yoga me ensinou que sofrer é opcional.


O Yoga ensina, também, a observamos com equanimidade e sem julgamento os acontecimentos bons e ruins da vida, porque nunca sabemos exatamente se as consequências dos fatos serão mais positivas ou mais negativas.


Por exemplo, com o amadurecimento, ser deficiente auditivo não faz mais a mínima diferença na minha vida. Aprendi a conviver com a perda. Além de conseguir perceber os ganhos que eu tive por causa da ortoesclerose:

  1. Aprendi a valorizar o silêncio e a quietude, perceber que existe um mundo de paz dentro de mim.

  2. Consegui me aposentar mais cedo. A lei permite aposentadoria por tempo de serviço reduzido para deficientes.

  3. Ligo e desligo os sons, conforme a minha vontade. Meu aparelho auditivo é como as pálpebras dos meus olhos.

  4. E, ainda, posso me fazer de surda para algumas bobagens que ouvimos por aí.

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Fico com a esperança que a medicina encontre novas soluções para a minha deficiência.


Se não, ainda assim tenho o conforto do silêncio e ainda assim tenho meus outros 5 sentidos para me guiarem.





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2 comentários


marli gavioli
04 de fev. de 2022

O silêncio é raro e repousante. Pode ser aterrorizante para quem não está preparado para ele. Achei lindo você aprender com os animais da floresta e superar tudo com o yoga. O aprendizado está à nossa volta e a superação, como bem você diz na aula de yoga, está no autoconhecimento, dentro de cada um de nós.

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Parabéns minha querida, convivi com a surdez do meu marido por muitos anos. E sei o quanto é um processo doloroso e difícil. Trazer a tona este tema e com esta leveza é sensacional.

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